Desculpem pela prolongada estiagem, meus dois leitores e meio. Foi um misto de preguiça com falta de inspiração, férias de São João e pequenos prazeres que um aniversariante (do dia 27/06) se permite, em lugar de escrever. Se tudo correr como planejado, já retomo uma boa frequência por aqui. To the Batmobile, let's go!
15/07/2024
Sugar
John Sugar (Colin Farrell) é um detetive particular, especializado em encontrar pessoas desaparecidas. Quando o conhecemos, ele está em Tóquio, em busca do filho sequestrado de um chefe da Yakuza. Após voltar a Los Angeles, onde mora, Sugar é contratado pelo magnata do cinema Jonathan Siegel (James Cromwell) para achar sua neta, a problemática Olivia, que já possui histórico de sumiços regados a drogas, mas sempre mantinha contato e sempre acabava voltando. Desta vez, porém, a demora e a falta de notícias deixam o avô preocupado. Investigando o paradeiro da moça (inclusive, a contragosto da agência que o emprega), Sugar vai puxando os fios de um mistério cheio de verdades incômodas.
Se é verdade que a trama de Sugar, nos oito episódios desta sua primeira temporada, não é bem das mais originais, não significa que falte charme ou interesse à série da Apple TV+.
Pra começo de conversa, existe este fascinante protagonista: um detetive cujo trabalho tem sempre muita chance de descambar para a violência, mas que tenta ser razoável e dialogar a cada vez que encara um meliante. Por outro lado, ele também reconhece de longe um mentiroso e mostra-se incansável ao encontrar seus alvos, exibindo um vigor físico e um destemor que contrastam com sua persona calma e amante do cinema e de coisas vintage em geral (como o Corvette Sting Ray 66 que dirige).
Embora ambientada no presente, a série tem trama, clima e design de produção imediatamente reconhecíveis como de film noir – exceto, claro, pelo fato de Sugar ser quase uma antítese total dos tipos durões e moralmente dúbios presentes em filmes assim. Ele é bom até a medula, não bebe, fala vários idiomas, e é genuinamente legal com pessoas vulneráveis, seja uma mulher bêbada que flerta com ele ou um mendigo e seu cão na porta do bar onde busca informação. Um tipo que, em mãos menos hábeis, cairia fácil na caricatura ou ganharia nossa antipatia por ser “legal demais”, mas que funciona extremamente bem.
Créditos sejam dados à charmosa co-direção, dividida entre o nosso Fernando Meirelles (Cidade de Deus) e Adam Arkin (ator e diretor, filho do saudoso Alan Arkin). O roteiro de Mark Protosevich vai muito bem quase o tempo todo, mas, lá pelo sexto episódio, um novo fato sobre John Sugar e a agência coloca a série em um rumo que ainda me pergunto se gosto ou não. Achei o plot twist entre descabido e desnecessário. Minha esperança é que esse novo fato não se torne o foco central de uma possível segunda temporada.
A gente entende melhor o “deslize” quando percebe que Mark Protosevich está apenas sendo ele mesmo, o cara que escreveu filmes divisivos, pra dizer o mínimo, como Eu Sou a Lenda e o primeiro Thor. Apesar de não terminar tão bem quanto começa, Sugar está entre as melhores coisas que o streaming ofereceu no primeiro semestre.