Hoje em dia, já nem faz sentido apontar a preguiça criativa que, já faz uns bons anos, tomou conta de Hollywood. É fenômeno consolidado e, pior ainda, abraçado pelo público: das dez maiores bilheterias do ano passado, impressionantes NOVE eram sequências – a única exceção foi Wicked, que não é uma continuação, mas chegou ao cinema planejado pra logo ganhar uma.
Particularmente, acho esta uma tendência terrível. Por melhor que seja rever bons personagens em novas aventuras, nem todo filme precisa acabar com as pessoas perguntando “quando será que sai o 2?” enquanto deixam o cinema. Às vezes, aquele único filme cumpre o sagrado propósito de divertir. Deveríamos reaprender a deixar que as histórias – mesmo aquelas muito boas – terminem. Nem tudo nessa vida precisa virar franquia.
Entretanto, estou pregando no deserto. Robô Selvagem já tem sua sequência encaminhada. Menos mal que estará a cargo do mesmo Chris Sanders que dirigiu este primeiro. Sanders tem boa mão: na Disney, escreveu as histórias dos principais sucessos da renascença do estúdio nos anos 90, como A Bela e a Fera, Aladdin e O Rei Leão. Estreou como diretor no ótimo Lilo & Stitch (2002). Deixando a Disney pela DreamWorks, esteve à frente de grandes sucessos: Como Treinar Seu Dragão (2010) e Os Croods (2013). Também dirigiu aquele filme do Harrison Ford com um cachorro digital, mas vamos fingir que não.
Robô Selvagem começa numa ilha, quando, durante uma tempestade, alguns animais, sem querer, ligam a robô Rozzum 7134 (voz de Lupita Nyong’o). Sem nenhum humano por perto, ela pergunta a todo animal que encontra quem seria seu novo dono. Sem resposta e sem um propósito na ilha, ela se dedica a aprender a comunicar-se com eles. Durante uma fuga, porém, cai sobre um ninho de gansos selvagens. Um único ovo resta intacto, e Rozzum 7134 se dedicará a protegê-lo, até que o pequeno ser dentro dele venha ao mundo.
Todos já vimos filmes sobre os temas de Robô Selvagem: robôs gente fina, maternidade inesperada e/ou complicada, uma literal “síndrome do patinho feio”, e retorno à natureza como antídoto da modernidade fria e tóxica. A animação de Sanders, porém, sobressai pela beleza de sua animação (com aquela bonita mistura de técnicas vista em O Gato de Botas 2) e pela progressiva naturalidade das emoções de Roz - simplificação que ela adota ao perceber que sua programação original não a ajudaria a seguir “viva” nem a criar seu “bebê”. É tocante como ela muda conforme passa o tempo, enfrentando os maiores medos e desafios de se ter um filho: a disposição para sacrificar tudo, a resignação compreensiva diante da rebeldia gratuita ou ingratidão, e o medo de perder aquele ser tão amado – um cuidado que ela acaba estendendo a todos os animais da ilha, quando enfrentam seu pior momento.
O final de Robô Selvagem é tão redentor e maduro, tão redondinho, que eu só posso mesmo me indignar por saber que vão esticar essa história, perfeitamente encerrada, para extrair cada centavo de dólar que este “universo” (argh!) possa render. No fim, é disso que se trata: nunca é sobre “dar ao povo o que ele quer”. Quase sempre, a única pessoa nos paparica sem querer nada em troca é a nossa mãe. O que a DreamWorks e outros estúdios querem é meter a mão no nosso bolso - mas, quando compensam entregando filmes bonitos assim, até que nem chiamos tanto. Espero estar errado sobre sequências quando Robô Selvagem 2 chegar.
2 comentários:
Salve, Marlo!
Ainda não assisti Robô Selvagem, mas legal saber que a DreamWorks está em grande forma. E continuações podem soar um conceito exaurido, mas também pode ser que saia dali uma série à Toy Story. A ver. E torcer.
Fala, Dogg! Rapaz, espero mesmo que pensem em boas histórias para continuações em geral, já que elas parecem inevitáveis. Tive outra bela sessão com Flow, o provável ganhador do Oscar da categoria este ano. Recomendo muito! Abração!
Postar um comentário