Sendo bastante honesto, uma das últimas coisas que eu esperava estar fazendo em meados de 2025 era escrever sobre um disco do The Ting Tings, porque, por mais simpáticas que as canções da dupla (e casal) Katie White e Jules De Martino fossem, elas sempre me deram aquela impressão de fast food musical. Lá em 2008, “That’s Not My Name” e “Shut Up and Let Me Go” surgiram como pílulas de escapismo dançante e estridente, e, para mim, morreu aí – até que, em 2014, a ótima “Wrong Club” surfou as marolas do tsunami disco que foi “Get Lucky”, do Daft Punk, do ano anterior.
Vai ver que a culpa é minha, já que nunca havia colocado um disco do The Ting Tings pra tocar do começo ao fim, mas o fato é que, do meu ponto de vista, eles sempre estiveram, se tanto, na série C do pop, aquela multidão de esfomeados com (e/ou sem) talento e substância, que raramente consegue furar a resistente e pouco espaçosa bolha do topo das paradas. O Spotify, porém, entende que a minha obsessão com “Wrong Club” me qualifica como seguidor interessado e me sugeriu escutar Home, o novo álbum.
E, homi, não é que o danado é uma bela surpresa?
Pra começo de conversa, esqueça batidões, eletropop, disco, ou qualquer coisa que lembre os “velhos” Ting Tings - e que o fã me perdoe caso Home se pareça com Sounds From Nowheresville (2012) ou The Black Light (2018), dos quais não ouvi absolutamente nada – pois este aqui é um bonito álbum de soft rock, numa pegada eletroacústica que lembra Fleetwood Mac e Dire Straits, pasme! Tudo é muito melodioso, harmonioso e gostoso de ouvir, de uma elegância que remete imediatamente ao fim dos anos 1970. Não fosse um rótulo tão pedante (coisa que o disco não é), daria pra chamar de AOR (Adult-Oriented Rock), mas, melhor não.
Com seu título agridoce, “Good People Do Bad Things” já estabelece o tom do disco, com a bonita voz de Katie White sobre uma “cozinha” bastante segura e potente, desembocando num solo de guitarra que vai trazer à memória flashes de Mark Knopfler, do Dire Straits. “Dreaming”, a faixa seguinte, tem uma intro de tom épico, com loops de bateria e acordes ao piano elétrico, emoldurando uma melodia que não soaria equivocada na voz de Stevie Nicks, do Fleetwood Mac.
“Home” abre com harmonias vocais a cappella para desaguar num folk country marcial vigoroso, com Katie dividindo o canto com Jules. Lá pelo finzinho, ainda cabe um solo de sax tenor – e impressiona ouvir a riqueza desses arranjos, num tempo em que música é vista por muita gente como só mais um penduricalho numa trend de 15 segundos no TikTok. Home tem uma simplicidade opulenta e muito bem cuidada, por mais que o conceito soe contraditório.
Uma coisa que me agrada muitíssimo é o uso de bonitos solos de guitarra, esta instituição do rock praticamente sepultada nos tempos que correm. Em canções mais introspectivas e acústicas, como as vizinhas “In My Hand” e “Danced on the Wire”, Katie e Jules soam como James Taylor e Carole King modernos. Da virada inicial de bateria à explosão do refrão, “Song for Meadow” parece pinçada diretamente do repertório setentista de gente como Steely Dan, Player ou Christopher Cross.
A penúltima e reflexiva “Mind Thunder” revela
questionamento e inquietação com os tempos atuais. Fechando o disco, “Down” é romantismo
acústico levado ao violão, com um refrão feito pra uma plateia acompanhar, e
sua calmaria só é interrompida pela chegada de piano, guitarra e sintetizadores
discretos, num bonito crescendo, botando ponto final em um disco anacrônico (e o
digo como um sincero elogio), cheio de beleza e virtude. Se é por este
caminho de carinhosa nostalgia e altíssima qualidade que The Ting Tings vão de
agora em diante, fico muito feliz em percorrê-lo com eles.