06/01/2025

Gladiador II


Muita coisa conspirava contra a existência de Gladiador II. Primeiro, havia o óbvio ululante de que Gladiador (2000), de Ridley Scott, vencedor do Oscar de Melhor Filme (num tempo em que o termo “franquia” não era carne-de-vaca em Hollywood), contava uma história com começo, meio e fim. Segundo que, quando foi anunciada a produção da sequência, já haviam passado mais de duas décadas desde o original. Terceiro que, apesar da “envergadura moral” de ter sido o diretor do primeiro filme, Ridley Scott vinha de uma série com um filme bom, mas pouco visto (O Último Duelo, 2021), e de outros massacrados sem dó (Casa Gucci, 2021; Napoleão, 2023). Era bem alta a chance de o novo filme ser ruim o suficiente para manchar o legado do antigo.

Para surpresa geral, levando em conta o prospecto muito desfavorável, Gladiador II periga até parecer um filme melhor do que realmente é. Talvez estejamos todos sendo um pouco exigente demais com o velho Ridley, esquecendo que ele já tem 87 anos e absolutamente nada a provar, a esta altura (embora assistindo ao fabuloso Jurado nº 2, que Clint Eastwood dirigiu aos 94, possamos perceber que idade avançada não significa pulso frouxo). Em pouco mais de duas horas, Gladiador II honra seu predecessor, entregando um espetáculo honesto e divertido  - nada mais do que sua obrigação, com o astronômico orçamento de 310 milhões de dólares – mas é só.

A opção de Scott em ajudar o espectador a lembrar do original a todo instante vai muito além da sequência de abertura, que o resume numa bonita animação. Nomes, pessoas, frases e objetos retornam e, com eles, um novo, carismático e numeroso elenco, incluindo Paul Mescal, Pedro Pascal, Denzel Washington, Connie Nielsen e Joseph Quinn, entre outros. Tudo para contar a história de Hanno (Mescal), o herói que sabemos desde o início tratar-se do filho de Maximus Decimus (Russell Crowe) com Lucilla (Nielsen), mandado para longe de Roma em nome de sua segurança.

Comandada por dois jovens imperadores sifilíticos, Roma está em franca decadência e um de seus últimos atos de “glória” é justamente a invasão da nação moura onde Hanno vive com sua esposa, a exímia arqueira Arishat. Durante a invasão, liderada pelo general Acacius (Pascal), ela é morta e, como se ainda tivesse poucos motivos para odiar Roma e os romanos, Hanno é capturado, feito escravo e, logo em seguida, gladiador. Como seu pai, ele jura vingança pela esposa morta.

Parece familiar porque é. Seja nas homenagens ao filme clássico ou nas críticas ao imperialismo, sutileza não é o forte deste filme, mas nem isso chega a configurar um problema tão grande, porque Scott, quando se vê inspirado, sabe dar às pessoas o que elas querem. Mesmo que esteja sofrendo pra recuperar na bilheteria seu custo absurdo, ele teve repercussão geralmente positiva entre crítica e público. Já perto de chegar ao streaming, deve se transformar num favorito deste início de ano para aqueles que, como eu, estavam desconfiados demais para arriscar uma ida ao cinema (lazer caro!). Que não tenha se tornado um fenômeno pop como seu antecessor é sinal de que talvez estivéssemos melhor sem ele, mas a mera existência de Gladiador II não chega a ser um incômodo. Podia ter sido muito pior.

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