01/02/2024

Aquaman 2: O Reino Perdido


Primeiramente, um desagravo. Senta que lá vem história.

Este filme marca o fim de uma era dominada pela visão de Zack Snyder do que deveria ser o Universo DC no cinema. Tudo começou com o bom (e nada mais) O Homem de Aço, que ele dirigiu em 2013. Ao longo de uma década, houve erros e acertos. Snyder não foi o único responsável pelos filmes que vimos, mas não há dúvidas de que o UDC tinha sua marca estampada em cada fotograma.

Agora, acabou. ALELUIA!

Não me leve a mal. No começo, tive muita fé de que Zack Snyder era a pessoa certa para comandar a reinvenção da DC no cinema – naquele 2013, já fazia 5 anos que a Marvel ditava as regras e, no ano anterior, havia explodido cabeças com o primeiro filme dos Vingadores. Snyder vinha de um bom remake de Madrugada dos Mortos (2004) e do grande sucesso de 300 (2006), que lançou seu nome como boa promessa para adaptar outros quadrinhos.

Quando foi lançado, O Homem de Aço subverteu uma série de preceitos inscritos em rocha na mitologia do Superman: em vez de ser alguém que tentava ser o mais normal possível, cuja índole era uma espécie de ideal de ética e bondade, ele se sentia mais alienígena, ou “deus”, pairando (de modo bastante literal) sobre a humanidade; em vez de pai amoroso e bom conselheiro, Jonathan Kent era um “general” castrador; em vez de proteger os civis em seu entorno, Superman foi tão responsável pela destruição de Metrópolis quanto Zod; em vez de preservar a vida acima de tudo, o herói quebrou o pescoço do primeiro vilão que enfrentou.

OK, pode-se argumentar que ele estava enfrentando alguém que se equiparava a ele em poder e até o superava como estrategista, mas, se tem algo que o Superman é sempre capaz de encontrar – nos quadrinhos que o filme dizia adaptar – é um jeito de evitar mortes. Qualquer uma.

Mas, vá lá, estávamos empolgados só de ver o Superman de volta às telas e perdoamos esses disparates. Perdoamos, inclusive, a feiura de todos aqueles filtros escuros, as cores desbotadas, o CGI pavoroso e o desgraçado tom sombrio que ele cismou que os heróis da DC deveriam ostentar - conceito que grande parte do mundo abraçou como a tábua da salvação, repetido em Batman v Superman: A Origem da Justiça (2016) e nas duas versões de Liga da Justiça (2017 e 2021). Curiosamente, os filmes de maior prestígio crítico e popular dessa era – Mulher-Maravilha (2017) e Aquaman (2018) – foram exatamente os que primeiro tentaram se afastar do modus operandi snyderiano. Era óbvio que alguma coisa não estava certa... e que esta coisa era uma pessoa e seu suposto “visionarismo”.

Quando James Gunn - diretor da trilogia dos Guardiões da Galáxia (2014-2023) e do ótimo O Esquadrão Suicida (2021) - foi anunciado como capitão da futura reformulação do UDC, a ser iniciada em 2025, um sopro de alívio atingiu o coração do fã já cansado de tanta câmera lenta e falta de imaginação. Não há garantias contra decepção, é verdade, mas comparar Snyder a Gunn equivale a querer comparar um Neanderthal a Einstein.

Por fim, quero vaticinar que, um dia, Zack Snyder há de ser desmascarado como o maior estelionatário de cinema – alguém a quem são sempre dados muito dinheiro e muita liberdade e que acaba entregando uns filmes sempre muito ruins, cujo fracasso crítico e/ou financeiro ele sempre acaba creditando justamente à falta de dinheiro ou liberdade. Pior: de alguma forma, ele ainda consegue convencer os mesmos estúdios aos quais deu prejuízo a dar-lhe ainda mais dinheiro e liberdade – e, depois, seguir reclamando da falta destes! Picaretice é pouco, o que Snyder faz ainda não tem nome.

"O cinema desse cara fede, ainda bem que vim de máscara!"

Dito isto, Aquaman 2: O Reino Perdido.

Este segundo filme do soberano da Atlântida e fanfarrão-mor da Liga da Justiça (uma caracterização que funciona por conta do imenso carisma do astro Jason Momoa, mas que pouco tem a ver com o personagem nos gibis) é dirigido pelo mesmo James Wan do primeiro. Tem alguns velhos vícios dos filmes de super-heróis: cenas confusas para disfarçar CGI meia-boca, humor inoportuno, vilões fuleiros, mas acaba sendo uma aventura simpática – e não apenas por conta de Momoa, mas, também, porque Patrick Wilson tem seus bons momentos como o Mestre do Oceano, irmão de Aquaman, derrotado e aprisionado ao fim do primeiro filme. A dinâmica entre os irmãos é boba, às vezes, mas, em geral, funciona. Este Aquaman está para a DC como Thor está para a Marvel: é o palhaço residente.

Sendo este um universo condenado, as refilmagens devem ter sido feitas para garantir que não ficassem pontas soltas – tanto que a cena pós-créditos é apenas uma gracinha (nojeirinha?) já vista durante o filme. A aposta no seguro é tamanha que não se veem outros heróis e tudo parece uma reciclagem do primeiro. O vilão é o mesmo Arraia Negra, com a mesma motivação do primeiro filme: vingar o pai. A diferença é que agora ele busca a mesma a coisa estando possuído pelo espírito de um antigo rei maligno. Yahya Abdul-Mateen II está no automático e seu David Kane não tem qualquer profundidade (piada involuntária, desculpe). "Punida" pelos muitos problemas em sua nada privada vida pessoal, Amber Heard entra e sai de cena como Mera e mal é percebida.


Na história, ficou impossível não lembrar da Wakanda de Pantera Negra quando a Atlântida se vê na responsabilidade de revelar-se ao mundo e intervir nas questões ecológicas e climáticas que ameaçam a água e a terra. Tem sua graça ver o Aquaman tendo seu momento "Homem de Ferro" durante uma coletiva de imprensa na ONU.

No fim das contas, por mais que Aquaman 2 possa entreter, pouca gente se animou a ir vê-lo. Demorou demais a sair e, agora, não tem qualquer consequência para os rumos do UDC. Não dá nem para culpar o público, mas espera-se que o fato de que saímos de um primeiro filme bilionário para um segundo com prejuízo acenda algumas luzes amarelas. Passado o encanto gratuito (e bastante prolongado) da novidade, o público deste tipo de filme já não se ilude com pouco. Que DC e Marvel tirem lições dos tropeços.

4 comentários:

Anônimo disse...

Não consegui passar dos 30 minutos do filme. Mas vou tentar ver o resto 😄

Caesius Maximus disse...

Antes de mais nada, e sem querer defender o Sups do Snyder, não lembro de uma avalanche de reclamações relativos a Superman II, quando Kal-El deixa os kryptonianos despencar abismo abaixo na Fortaleza da Solidão.

Sim, sei que Snyder estava buscando adaptar o Superman dos quadrinhos atuais, mas sejamos francos: não foi a primeira vez que vemos o Azulão matar alguém nas telonas. A diferença é que o assassinato de Zod no filme do visionário foi mais gráfica e violenta.

Dito isso, e com base no seu texto, não vejo motivos para assistir ao 2º filme do Aquaman.

E olha que sou extremamente crítico ao novo multiverso DC nos cinemas, pois se há um multiverso, não havia motivos para sepultar qualquer coisa que já tenha sido feita, inclusive não era necessário chutar Henry Cavill do papel, pois poderia continuar suas aventuras no respectivo Snyderverso.

Da mesma forma como o Batman de Robert Pattinson vai existir, porque não deixar o menino Snyder dar sequência aos seus planos? Vai que ele consegue engatar algo mais decente?

Até porque, O Pacificador do Gunn bebeu muito dessa fonte e mostrou que há vida no meio da bagunça que a criação do Snyder. Era só colocar pra rodar.

Na pior das situações, temos Crise nas Infinitas Terras, que logicamente poderia servir como a melhor desculpa pra matar todo mundo e recomeçar do zero em grande estilo.

Marlo de Sousa disse...

- ANÔNIMO, vai na fé, já que é pra fechar a tampa de vez.

- CAESIUS MAXIMUS, eu provavelmente não reclamei porque só vi Superman II uma vez, em tenra idade e, depois, nunca mais. Posso aproveitar sua observação e assisti-lo com um olhar mais crítico agora. Cá pra nós, a diferença entre os filmes do Pattinson e do Cavill (e nem vou botar os dois no microscópio como atores, porque aí é covardia) é que o de um é um puta filme, e os do outro são pilhas de boas intenções, com execução variando entre OK e terrível. Se tudo deu certo, a Warner acordou pro golpe do Snyder e deixou esse abacaxi pra Netflix descascar. A gente bem tá vendo o que ele tem produzido por lá.

Abraços!

Caesius Maximus disse...

Marlo, relendo meu comentário dá até a impressão de que sou viúva do Snyder, mas é apenas revolta pela forma imbecil como os engravatados da Warner tratam os personagens da DC para o cinema.

Acertam de um lado, tentam espremer a fruta até onde podem, trocam os pés pelas mãos e os fãs é que pagam com olhos sangrando de tristeza. heheheheheheheh

Abraço!